domingo, 5 de abril de 2009

Desventura

Olá...

Novamente peço desculpas pelo grande período de tempo sem ao menos dar alguma satisfação da minha ausência.

Uma série muito grande de pensamentos estão rondando a minha mente nos últimos dias e por mais que eu tente, não consigo transcrevê-los aqui. Em uma tentativa praticamente inútil eu tento fazer uso de palavras dos outros para tentar me expressar, e infelizmente não é a primeira vez que isso acontece, e mais triste é dizer que essas mesmas palavras já foram usadas por mim para expressar outras coisas. A reflexão de hoje nada mais é que um sinal de que eu ainda estou aqui. Tenham a certeza de que meus devaneios não param. Espero que num futuro próximo esse bloqueio se desfaça, e eu consiga ser mais objetivo para explicar o que está acontecendo.


"18 de Agosto"

"Por que aquilo que faz a felicidade do homem tem que se tornar também a fonte de sua desventura?
Toda esta ardente sensibilidade de meu coração pela natureza, cuja vida me invadia com tanta voluptosidade fazendo do mundo à minha volta um paraíso, transformou-se agora num insuportável carrasco, num espírito atormentador que me persegue por toda parte. Outrora, do alto do rochedo, contemplando o vale fértil, para além do rio até aquelas colinas, via tudo ao meu redor germinando e brotando;via aquelas montanhas cobertas, do sopé ao cume, com árvores altas e espessas, aqueles vales em suas ondulações variadas, sombreados pelas mais graciosas matas, e o rio suave deslizando por entre os canaviais sibilantes, refletindo as nuvens delicadas que a suave brisa da tarde embalava pelo céu; via então as aves à minha volta, animando a floresta, e os milhões de enxames de mosquitos dançando com valentia no último raio do sol poente, e o seu último olhar fulgurante libertava da relva os escaravelhos, que zumbiam; olhava para o chão, atraído pelos zunidos e entrelaçamentos ao meu redor, e o musgo que extrai o seu alimento da dura rocha, e a giesta que cresce ao longo da árida duna de areia, revelavam-me a vida interior da natureza, calorosa e sagrada: como tudo isso penetrava em meu coração ardente, fazendo-me sentir como que deificado neste transbordamento, e moviam-se em minha alma as formas majestosas do mundo infinito, abismos surgiam à minha frente, correntezas despenhavam-se, os rios corriam lá embaixo e a floresta e as montanhas retumbavam; e eu via todas as impenetráveis forças criadoras agirem nas profundezas da terra; e então, aglomeravam-se entre o céu e a terra as inúmeras espécies de criaturas.
Tudo, tudo povoado por milhares de formas, e o seres humanos abrigavam-se em suas casinhas, aninham-se e dominam em seu espírito o vasto mundo! Pobres coitados! Vocês subestimam tudo por serem assim tão pequenos.
-Das montanhas inacessíveis nas regiões desertas, onde ainda ninguém pisou, até o extremo do oceano desconhecido, sopra o espírito do eterno criador e ele se alegra com cada grão de areia que o absorve e vive. Ah! Como desejei voar então com as asas de um grou que passou sobre mim, até o outro lado deste mar incomensurável, para beber cada impulso de vida ascendente deste cálice espumante do infinito, e sentir só por um instante, com a força limitada de meu peito, uma gota da glória do Ser que tudo produz em si e por si.
Irmão, só as lembranças daquele momento já me fazem bem. Mesmo os esforços de evocar e exprimir novamente aquelas inefáveis sensações elevam a minha alma além de si mesma, fazendo-me sentir duplamente os temores da situação em que me encontro agora.
É como se uma cortina se abrisse diante de minha alma e o espetáculo da vida infinita se transformasse nas profundezas de um túmulo eternamente aberto diante de mim. Você pode dizer: 'É isso!' Já que tudo é passageiro? Já que tudo se desesnrola com a rapidez do tempo, e toda a energia de seu ser dura tão pouco, ah! , arrastado pela torrente, submerso e esmagado contra os rochedos?Não há momento que não o devore, a você e aos seus, não há momento em que você não seja um destruidor, em que não tenha de sê-lo; o passeio mais inocente custa a vida de milhares de pobres insetos, um passo arruina o penoso trabalho das formigas e empurra um pequenno mundo para um túmulo infame. Ah! As grandes e raras mísérias do mundo: essas inundações que varrem as suas vilas, esses tremores de terra que engolem as suas cidades, não me comovem; o que me corrói o coração é a força destrutiva, oculta no âmago da natureza; ela não cria nada sem destruir a si mesma e ao seu próximo. E assim aflito titubeio. O céu e a terra e as suas forças criadoras me rodeiam: não passam de um monstro eternamente devorador e ruminante."